A partir do século II a.C., faz-se sempre mais forte até tomar- se dominante no século I a.C. e ainda mais tarde, a tendência ao “ecletismo” (termo derivado do grego ek-léghein, que significa: “escolher e retinir, tomando de várias partes”), que visava retinir e fundir o melhor (ou o que era considerado tal) das várias escolas.
As causas que produziram esse fenômeno são numerosas: a exaustão da vitalidade das escolas singulares, a polarização unilateral de sua problemática, a erosão de muitas barreiras teóricas operada pelo ceticismo, o difundido probabilismo da Academia, a influência do espírito prático romano e a valorização do senso comum.
Todas as escolas foram contagiadas. O Jardim ressentiu-se pouco, por causa de sua atitude fechada a qualquer discussão e possibilidade de modificações, marca de Epicuro. O Perípatos aristotélico ressentiu-se moderadamente. Mais acentuadamente ressentiu-se a Estoá que, por outro lado, soube sempre conservar o autêntico espírito originário que a sustentava. A total disponibilidade para a instância eclética deu-se com a Academia que, mais uma vez, inverteu a rota, repudiando o ceticismo radical. De resto, era lógico que a Academia devesse tomar-se a tribuna do verbo eclético: já com Arcésilau ela renunciara à fidelidade ao próprio patrimônio espiritual e ao próprio passado, não tendo assim nada a conservar como razão da própria existência, ainda mais que o ceticismo dialético que abraçara devia fatalmente levar a desaguadouros ecléticos.
O ecletismo foi introduzido oficialmente na Academia por Fílon de Larissa (que se tomou chefe da escola por volta de 110 a.C.). A novidade de Fílon, introduzida por volta de 87 a.C. através de dois livros escritos em Roma, deveria indubitavelmente ser aquela que Sexto Empírico assinala na seguinte passagem: “Fílon afirma que, quanto ao critério estóico, isto é, à representação catalética, as coisas são incompreensíveis; mas, quanto à natureza das coisas mesmas, compreensíveis”.
A passagem, na interpretação de Cícero, diria isto: o critério de verdade estóico (a representação compreensiva) não rege; e, posto que não rege o critério estóico, que é o mais refinado, não rege nenhum critério; isto não implica, todavia, que as coisas sejam “objetivamente incompreensíveis”; elas são, simplesmente, “incompreendidas por nós”. Com esta afirmação, Fílon se coloca fora do ceticismo. Com efeito, dizer que as coisas “são compreensíveis quanto à sua natureza” significa fazer uma afirmação cuja pretensa intencionalidade ontológica é “dogmática”, segundo os cânones céticos. Com efeito, significa admitir uma verdade ontológica, mesmo negando a possibilidade do seu correspondente lógico e gnosiológico. O cético não pode dizer “a verdade existe, eu é que não a conheço”, mas só pode dizer: “não sei se a verdade existe; sou eu, em todo caso, quem não a conhece”.
Fílon deve ter sido impelido a essa inovação, como os historiadores da filosofia bem o notaram há tanto tempo, por uma objeção proposta pela discípulo Antíoco à doutrina de Caméades, que a pusera em situação de xeque-mate. Caméades dissera: a) existem representações falsas (que, assim, não dão lugar a nenhuma certeza), b) não existem representações verdadeiras que se distingam perfeitamente das falsas por seu caráter específico (e, em conseqüência, não se pode distinguir com nitidez as representações certas das não certas). Mas Antíoco objetou o que segue: a primeira proposição (que admite com nitidez a possibilidade de distinguir representações falsas) contradiz a segunda (que diz o contrário) e vice-versa; logo, se se aceita a primeira, exclui-se a segunda; se se aceita a segunda, exclui-se a primeira; em todo o caso, fica abalada a base da posição cameadiana.
Eis, então, a resposta de Fílon, que Cícero faz sua: não é necessário suprimir totalmente a verdade, mas é necessário admitir a distinção entre verdadeiro e falso; todavia, não temos um critério que nos leve a esta verdade e, assim, à certeza, mas temos somente aparências, que conduzem à probabilidade. Não chegamos à percepção certa da verdade objetiva, mas nos avizinhamos dela com a evidência do provável.
Nasce àssim um novo conceito de “provável”, que não é mais o irônico-dialético, com o qual Carnéades refutava os estóicos, porque este vem carregado de uma valência decisivamente positiva, que está ausente no contexto carneadiano. Com efeito, a admissão da existência da verdade dá uma intencionalidade ontológica ao “provável” que, em conseqüência, torna-se “aquilo que, para nós, está no lugar do verdadeiro” e se distingue do não- provável, exatamente enquanto se avizinha do verdadeiro.
Caméades nega as duas proposições estóicas: a) o verdadeiro existe, b) existe um critério para colher o verdadeiro; Fílon nega somente a segunda. Mas a admissão da primeira muda o sentido da negação da segunda e, principalmente, modifica a valência do “provável” que, posto ao lado de uma verdade objetiva, toma-se de qualquer modo seu reflexo positivo.