Os princípios da demonstração e o princípio da não-contradição

As premissas e os princípios da demonstração são colhidos por indução ou por intuição. A esse propósito, deve-se notar que, antes de mais nada, cada ciência assume premissas e princípios próprios, isto é, premissas e princípios que só a ela são peculiares.

Em primeiro lugar, assume a existência do âmbito, ou melhor (em termos lógicos), a existência do sujeito em tomo do qual verterão todas as suas determinações, que Aristóteles chama de gênero-sujeito. Por exemplo: a aritmética assume a existência da unidade e do número, a geometria a existência da grandeza espacial e assim por diante. E cada ciência caracteriza o seu sujeito pelo caminho da definição.

Em segundo lugar, cada ciência trata de definir o significado de uma série de termos que lhe pertencem (a aritmética, por exemplo, define o significado de pares, ímpares etc.; a geometria define o significado de comensurável, incomensurável etc.), mas não assume a sua existência e sim a demonstra, provando preci­samente que se trata de características que competem ao seu objeto.

Em terceiro lugar, para poder fazer isso, as ciências devem fazer uso de certos “axiomas”, ou seja, proposição verdadeiras de verdade intuitiva. E são esses os princípios por força dos quais acontece a demonstração. Um exemplo de axioma é o Seguinte: “Se de iguais tiram-se iguais, restam iguais.”

Entre os axiomas, há alguns que são “comuns” a várias ciências (como o axioma citado), outros a todas as ciências, sem exceção, como o princípio da não-contradição (não se pode negar e afirmar dois predicados contraditórios do mesmo sujeito no mesmo tempo e na mesma relação) ou o do terceiro excluído (não é possível haver um termo médio entre dois contraditórios). São os famosos princípios que podem ser chamados transcendentais, isto é, válidos para toda forma de pensar enquanto tal (porque válidos para todo ente enquanto tal), sabidos por si mesmos e, portanto, primários. Eles são as condições incondicionadas de toda demonstração e, obviamente, são indemonstráveis, porque toda forma de demons­tração os pressupõe. No quarto livro da Metafísica, Aristóteles mostrou que é possível uma espécie de prova dialética por “refuta­ção” (élenchos) desses princípios supremos. E a refutação consiste em mostrar que quem quer que negue esses princípios é obrigado a usá-los precisamente para negá-los. Quem diz que “o princípio da não-contradição não vale”, por exemplo, se quiser que essa asser­tiva tenha sentido, deve excluir a assertiva a esse contraditório, isto é, deve aplicar o princípio da não-contradição exatamente no momento em que o nega. E assim são todas as verdades últimas: para negá-las, somos obrigados a fazer uso delas e, portanto, a reafirmá-las.