A involução dos últimos físicos em sentido eclético e o retorno ao monismo: Diógenes de Apolônia e Arquelau de Atenas

As últimas manifestações da filosofia da physis assinalam, pelo menos em parte, uma involução em sentido eclético. Ou seja, tende-se a combinar as ideias dos filósofos anteriores. Alguns o fizeram de modo evidentemente inábil. Houve quem tenha tentado uma combinação entre Tales e Heráclito, propondo como princípio a água, da qual ter-se-ia gerado o fogo, que venceu a água e gerou o cosmos. Outros pensaram como princípio “um elemento mais denso do que o fogo e mais sutil do que o ar”, concebendo-o também como infinito. É evidente a tentativa de mediar Heráclito e Anaxímenes, por um lado, e Tales e Anaxímenes, por outro.

Já bem mais séria foi a tentativa de Diógenes de Apolônia, que deve ter exercido sua atividade em Atenas entre 440 e 423 a.C. Diógenes sustentou a necessidade de retomar ao monismo do princípio, porque, em sua opinião, se os princípios fossem muitos, de natureza diferente entre si, não se poderiam misturar nem agir um sobre o outro. Assim, é necessário que todas as coisas renasçam por transformação a partir de um mesmo princípio. Esse princípio é “ar infinito”, mas “é dotado de muita inteligência”.

Nessa teoria, ele combina Anaximandro e Anaxágoras. Eis a sua mais conhecida passagem desenvolvendo esse conceito: “Parece-me que aquilo que os homens chamam de ar é dotado de inteligência, a todos regendo e governando. Porque, precisamente, ele parece-me ser Deus, chegando a toda parte, dispondo de tudo e estando dentro de toda coisa. Não há nada que não participe dele: entretanto, nenhuma coisa dele participa na mesma medida de outra, pois muitos são os modos do próprio ar e da inteligência. Com efeito, tem muitos modos: mais quente e mais frio, mais seco e mais úmido, mais parado e mais rápido. E há muitas outras modifica­ções infinitas de prazer e de cor. Também as almas de todos os animais são a mesma coisa, um ar mais quente do que aquele de fora, onde vivemos, mas muito mais frio do que aquele que existe junto ao sol. Ora, esse calor não é igual em cada animal e nem mesmo em cada homem, mas também não difere muito: difere só o possível dentro dos limites da semelhança das coisas. Contudo, não podem ser verdadeiramente do mesmo modo as coisas que mudam, estas e aquelas, antes de se transformarem no mesmo. Assim, já que a transformação tem muitos modos, também de muitos modos e muitos devem ser os animais e, pelo grande número dè modificações, dessemelhantes entre si quanto à forma, ao modo de vida e à inteligência. Entretanto, todos vivem, veem e ouvem por obra do mesmo elemento e também a sua inteligência deriva desse elemento em todos eles.”

Naturalmente, a nossa alma é ar-pensamento, que, vivendo, respiramos, e que exala-se com o último suspiro quando morremos.

Tendo identificado a inteligência com o princípio-ar, Dióge­nes fez uso sistemático dela, exaltando aquela visão finalística do universo que, em Anaxágoras, era limitada. Ademais, a concepção teleológica de Diógenes teve uma notável influência no meio ateniense, constituindo um dos pontos de partida do pensamento socrático. Uma concepção análoga é atribuída a Arquelau de Atenas. Com efeito, parece que ele também falava, entre outras coisas, de “ar infinito” e de “Inteligência”. Numerosas fontes o identificam como “mestre de Sócrates”.

Aristófanes caricaturizou Sócrates nas Nuvens. E as nuvens são precisamente ar. Sócrates desce das nuvens e prega as nuvens, isto é, o ar. Os contemporâneos de Sócrates, portanto, relaciona- vam-no com esses pensadores e com os sofistas. E, efetivamente, não se pode prescindir desses pensadores para compreender Sócrates em todos os seus aspectos e também naqueles que as fontes lhe atribuem, como veremos adiante.