O médio estoicismo: Panécio e Possidônio

Panécio (nascido em Rodes em cerca de 185 a.C. e morto no início do século I a.C.) tomou-se chefe da Estoá em 129 a.C. Teve o mérito de reconduzir a escola ao antigo esplendor, embora ao preço de alguns compromissos ecletizantes. Modificou alguns pontos da psicologia e recuperou alguns aspectos da física (aban­donou a idéia da conflagração cósmica e abraçou a idéia da eternidade do mundo). Mas, principalmente, mitigou a aspereza da ética, sustentando que a virtude não é suficiente para a felicidade, sendo preciso ainda boa saúde, meios econômicos necessários e força. Valorizou os “deveres”, dedicando a eles toda a sua atenção. Por fim, repudiou a apatia. A importância de Panécio está principalmente na valorização dos “deveres”. A sua obra Sobre os deveres influenciou muito Cícero, que reteve de Panécio o conceito de “officium”, transmitindo-o ao Ocidente como uma conquista definitiva do pensamento moral.

Possidônio (nascido em Apanca entre 140 e 130 a.C. e morto após 51 a.C.) prosseguiu na nova linha que o mestre Panécio imprimira à Estoá. Mas não lhe sucedeu como professor, preferindo abrir uma escola em Rodes. Compartilhava da idéia fundamental do mestre segundo a qual a verdade não está necessariamente encerrada só nos dogmas do Pórtico, podendo portanto advir oportunas contribuições de outras escolas. Assim, Possidônio abriu o Pórtico às influências platônicas e aristotélicas, não hesitando em corrigir Crísipo com Platão, embora mantendo substancialmente firme a visão da Estoá.

Mais do que pelas tentativas de correção dos dogmas da Estoá (das quais, por outro lado, estamos escassamente informados, pois só possuímos fragmentos delas), Possidônio se distinguiu pelos seus formidáveis conhecimentos científicos. Provavelmente, o seu maior mérito consiste, como destacaram pesquisas recentes, em ter procurado atualizar a doutrina estóica em relação ao progresso que as ciências alcançaram depois da fundação do Pórtico. E certo que, pela vastidão dos conhecimentos e variedades do saber, Pos­sidônio foi a mente mais universal que a Grécia teve depois de Aristóteles. E seus contemporâneos bem se deram conta da excepcionalidade da personagem, tanto que muitos iam a Rodes escutá-lo, não só provindos da Grécia, mas também de Roma; chegaram a visitá-lo até personalidades como Cícero e o grande Pompeu. Esta passagem de Cícero, melhor que nenhuma outra, dá uma idéia da estatura de Possidônio: “Também eu vi Possidônio muitas vezes pessoalmente, mas quero narrar aquilo que Pompeu contava sobre ele. Pompeu voltava da Síria. Chegando a Rodes, quis ouvir Possidônio. Disseram-lhe que este estava muito doente — tivera uma violenta crise de artrite —, mas Pompeu quis ver de qualquer jeito o grande filósofo. Quando chegou até ele, saudou-o, elogiou-o e disse-lhe que lamentava não poder ouvi-lo. Então Possidônio respondeu: Não, não: não permitirei nunca que, por culpa de uma dor física, um homem como você tenha vindo até aqui para nada. E assim Possidônio, deitado na cama, como narra Pompeu, discu­tiu com profundidade e eloqüência exatamente a tese de que não há nenhum bem fora do bem moral. E, nos momentos em que a dor era mais intensa, repetia: Não apareça, dor! Estou doente, sim, mas nunca admitirei que seja um mal.” A antiga doutrina do Pórtico, segundo a qual a dor física não é um “verdadeiro” mal, encontra neste testemunho uma esplêndida confirmação.