Conclusões sobre a escatologia platônica

A verdade fundamental que os mitos procuram sugerir e fazer acreditar é uma verdade de “fé raciocinada”, como vimos na seção introdutória. Em síntese, essa verdade consiste em admitir que o homem encontra-se de passagem na terra e que a vida terrena constitui uma prova. A verdadeira vida situa-se no além, no Hades (o invisível). No Hades, a alma é “julgada” exclusiva­mente com base no critério da justiça e da injustiça, da temperança e da devassidão, da virtude e do vício. Com nada mais se preocu­pam os juizes do além; de nada importa o fato de que a alma tenha sido a alma de um grande rei ou do mais humilde dos súditos; o que conta são apenas os sinais de justiça e de injustiça que a alma traz em si. E tríplice pode ser o destino que cabe às almas: a) caso tenha vivido em plena justiça, receberá um prêmio (andará por lugares maravilhosos, nas Ilhas dos Bem-aventurados, ou por lugares ainda superiores e indescritíveis); b) caso tenha vivido em plena injustiça, a ponto de se ter tomado incurável, receberá castigo eterno (será precipitada no Tártaro); c) caso tenha cometido injustiças sanáveis, isto é, caso tenha vivido injustamente apenas’ em parte, arrependendo-se das próprias injustiças, então será apenas punida temporariamente (e após a expiação de suas culpas, receberá o prêmio que merece).

Além das idéias de “juízo”, de “prêmio” e de “castigo”, trans­parece em todos os mitos escatológicos a idéia do significado “libertador” das dores e dos sofrimentos humanos, que adquirem portanto um sentido preciso: “(...) a vantagemsobrevêm às almas apenas através de dores e sofrimentos,tanto aqui na terra como no Hades, porquanto não há outra maneira pela qual possamos nos libertar das injustiças.”

E, finalmente, transparece constantemente a idéia da força salvífica da razão e da filosofia, isto é, da busca e da visão da verdade que salva “para sempre”.