Acenos à psicologia do ato moral

Aristóteles teve ainda o mérito de haver tentado superar o intelectualismo socrático. Como bom realista que era, percebeu perfeitamente que uma coisa é “conhecer o bem” e outra é “fazer e realizar o bem”. E, conseqüentemente, procurou determinar os processos psíquicos pressupostos pelo ató moral.

Ele chamou a atenção sobretudo para o ato da “escolha” (pronáiresis), que vinculou estreitamente ao ato de “deliberação”. Quando queremos alcançar determinados fins, nós estabelecemos, através da “deliberação”, quais e quantos são os meios que coloca­remos em ação para chegar àqueles fins, dos mais remotos aos mais próximos. A “escolha” opera sobre estes últimos, transformando-os em ato. Assim, para Aristóteles, a “escolha” diz respeito apenas aos “meios”, não aos fins; portanto, nos toma responsáveis, mas não necessariamente bons (ou maus). Com efeito, ser “bom” depende dos fins e, para Aristóteles, os fins não são objeto de “escolha”, mas sim de “volição”. Mas a vontade quer sempre e só o bem, ou melhor, aquilo que “aparece nas vestes do bem”. Desse modo, para ser bom, é preciso querer o “bem verdadeiro e não aparente”; mas só o homem virtuoso, ou seja, o homem bom, sabe reconhecer o verda­deiro bem. Como se vê, gira-se num círculo que, de resto, é interessantíssimo. Aquilo que Aristóteles busca, mas ainda não consegue encontrar, é o “livre arbítrio”. E suas análises sobre a questão são interessantíssimas precisamente por isso, ainda que aporéticas. Aristóteles compreendeu e afirmou que “o homem virtuoso vê o verdadeiro em toda coisa, considerando que é norma e medida de toda coisa”. Mas não explicou como e por que o homem se torna virtuoso. Assim, não é de surpreender o fato de que Aristóteles chegue a sustentar que, uma vez que o homem toma- se vicioso, não pode mais deixar de sê-lo, embora, na origem, fosse possível não tomar-se vicioso. Mas somos obrigados a reconhecer que não foi apenas Aristóteles, mas também nenhum outro filósofo grego, a não conseguir resolver essas aporias, pois só com o pensamento cristão é que o Ocidente iria descobrir os conceitos de vontade e de livre-arbítrio.