Os sofistas mais famosos colocavam-se em relação aos ouvintes na soberba atitude de quem sabe tudo. Sócrates, ao contrário, colocava-se diante dos interlocutores na atitude de quem não sabe, tendo tudo para aprender.
Mas muitos equívocos têm sido cometidos em relação a esse “não saber” socrático, a ponto de se ver nele o início do ceticismo. Na realidade, ele pretendia ser uma afirmação de ruptura: a) em relação ao saber dos naturalistas, que se havia revelado vão; b) em relação ao saber dos sofistas, que logo se havia revelado mera presunção; c) em relação ao saber dos políticos e dos cultores das várias artes, que quase sempre se revelava inconsistente e acrítico. Mas não é só isso: o significado da afirmação do não-saber socrático pode ser calibrado mais exatamente se, além de relacioná-lo com o saber dos homens, o relacionarmos também com o saber de Deus. Como veremos, para Sócrates Deus é onisciente, estendendo-se o seu conhecimento do universo ao homem, sem qualquer espécie de restrição. Ora, é precisamente quando comparado com a estatura desse saber divino que o saber humano mostra-se em toda a sua fragilidade e pequenez. E, nessa ótica, não apenas aquele saber ilusório de que falamos, mas também a própria sabedoria humana socrática revela-se um não-saber. De resto, na Apologia, interpretando a sentença do Oráculo de Delfos, segundo a qual ninguém era mais sábio do que Sócrates, o próprio Sócrates explicita esse conceito: “Unicamente Deus é sábio. E é isso o que ele quer significar em seu oráculo: que a sabedoria do homem pouco ou nada vale. Considerando Sócrates como sábio, creio eu, não quer se referir propriamente a mim, Sócrates, mas somente usar o meu nome como um exemplo. E quase como se houvesse querido dizer assim: ‘Homens, é sapientíssimo dentre vós aquele que, como Sócrates, tiver reconhecido que, na verdade, a sua sabedoria não tem valor.’ ”
A contraposição entre “saber divino” e “saber humano” era uma das antíteses muito caras a toda a sabedoria proveniente da Grécia — que, portanto, Sócrates volta a reafirmar.
Por fim, deve-se destacar o poderoso efeito irônico de benéfico abalo que o princípio do não-saber provocava nas relações com o interlocutor: acarretava o atrito do qual brotava a centelha do diálogo.