Naturalmente, sobretudo entre os orientalistas, não faltaram tentativas de situar no Oriente a origem da filosofia, especialmente com base na observação de analogias genéricas constatáveis entre as concepções dos primeiros filósofos gregos e certas ideias próprias da sabedoria oriental. Mas nenhuma dessas tentativas surtiu efeito. E, já a partir de fins do século passado, uma crítica rigorosa produziu uma série de provas verdadeiramente esmagadoras contra a tese de que a filosofia dos gregos derivou do Oriente.
a) Na época clássica, nenhum dos filósofos ou dos historiadores gregos faz sequer o mínimo aceno à pretensa origem oriental da filosofia. (Os primeiros a defender a tese de que a filosofia derivou do Oriente foram alguns orientais, por razões de orgulho nacionalista, ou seja, para atribuir em benefício de sua cultura esse especial título de glória. Assim, por exemplo, na época dos ptolomeus, os sacerdotes egípcios, tomando conhecimento da filosofia grega, pretenderam sustentar que ela derivava da sabedoria egípcia. E, em Alexandria, por volta de fins da era pagã e de princípios da era cristã, os hebreus que haviam absorvido a cultura helénica chegaram a defender a ideia de que a filosofia grega derivava das doutrinas de Moisés. O fato de que filósofos gregos da época cristã sustentaram a tese de que a filosofia derivou dos sacerdotes orientais, divinamente inspirados, não prova nada, porque esses filósofos já haviam perdido a confiança na filosofia entendida classicamente e objetivavam uma espécie de autolegitimação diante dos cristãos, que apresentavam seus textos como divinamente inspirados.)
b) Está demonstrado historicamente que os povos orientais com os quais os gregos tinham contato possuíam verdadeiramente uma forma de “sabedoria”, feita de convicções religiosas, mitos teológicos e “cosmogônicos”, mas não uma ciência filosófica baseada na razão pura (no logos, como dizem os gregos). Ou seja, possuíam um tipo de sabedoria análoga à que os próprios gregos possuíam antes de criar a filosofia.
c) Contudo, não temos conhecimento da utilização, por parte dos gregos, de qualquer escrito oriental ou de traduções desses textos. Antes de Alexandre, não se sabe de qualquer possibilidade de terem chegado à Grécia doutrinas dos hindus ou de outros povos da Ásia, bem como de que, na época em que surgiu a filosofia na Grécia, houvesse gregos em condições de compreender o discurso de um sacerdote egípcio ou de traduzir livros egípcios.
d) Considerando que algumas ideias dos filósofos gregos podem ter antecedentes precisos na sabedoria oriental (mas isso ainda precisa ser comprovado), tendo podido' assim dela derivarem, isso não mudaria a substância da questão que estamos discutindo. Com efeito, a partir do momento em que nasceu na Grécia, a filosofia representou uma nova forma de expressão espiritual, de tal modo que, no momento mesmo em que acolhia conteúdos que eram fruto de outras formas de vida espiritual, os transformava estruturalmente, dando-lhes uma forma rigorosamente lógica.