Ao longo dos séculos, revelaram-se paulatinamente diferentes aspectos de Platão. E é precisamente essa multiplicidade de fisionomias que constitui o segredo do fascínio que ele exerceu ao longo de toda história espiritual do Ocidente.
a) A partir dos filósofos da Academia, começou-se a ler Platão em perpectiva metafísico-gnosiológica, considerando-se como fulcro do platonismo a teoria das Idéias e do conhecimento das Idéias,
b) Posteriormente, com oneoplatonismo, acreditou-se encontrar a mensagem platônica mais autêntica na temática religiosa, na ânsia do divino e, em geral, na dimensão mística, maciçamente presentes na maior parte dos diálogos,
c) Essas duas interpretações se prolongaram, em diferentes formas, até os tempos modernos, quando, finalmente, surgiu uma terceira linha de interpretação, original e sugestiva, que indicou a temática política, ou melhor, ético-político-educativa, como a essência do platonismo. Os intérpretes do passado não haviam atribuído nenhuma importância a essa temática ou, pelo menos, não a haviam considerado em seu justo valor. Platão, entretanto, na Carta VII (recuperada como autêntica somente em nosso século), afirma claramente que sua paixão profunda foi precisamente a política. Sua própria vida confirma isso, especialmente através das experiências sicilianas. E, paradoxalmente, isso também é confirmado pelos próprios títulos das obras-primas platônicas, de A República e As Leis.
d) Finalmente, nas últimas décadas, recuperamos a dimensão da “oralidade dialética” e o sentido daquelas “coisas últimas” que, segundo a vontade de Platão, deviam permanecer “não escritas”. Acreditamos, entretanto, que o verdadeiro Platão não possa ser encontrado em nenhuma dessas perspectivassingularmente tomadas e consideradas válidas de modo exclusivo: parece-nos que só é possível encontrá-lo no conjunto de todos esses rumos de interpretação, na dinâmica própria de cada um deles. Com efeito, as três primeiras propostas de leitura, como dizíamos, iluminam três lados da poliédrica epolivalente especulação platônica, três dimensões ou três linhas de força que constantemente emergem, diversamente acentuadas ou objetivadas pelos escritos platônicos considerados individualmente ou em conjunto. A quarta proposta de leitura, a da “oralidade dialética”, explica a própria razão dessa polivalência e do caráter multifacetado da obra de Platão, deixando transparecer claramente os verdadeiros contornos do sistema platônico.